sábado, 30 de abril de 2011


A RUA SEM SAÍDA

Fiquei com tanta pena
Da rua sem saída que não tinha
Pra onde ir, caminho, esperança,
Que ali se acabava
Que ali se extinguia
Sem poder voltar ou começar do fim
Fiquei com tanta pena
Pelo tanto de nada naquilo tudo

Senti uma emoção pequena
De tonalidade serena
A manchar as paredes do meu coração
E são de tinta duas mãos
Ainda parado e perplexo por quase nada
Parou-se o tempo ao meu redor
Somente ali na rua sem saída
O trechinho de rua sem endereços
Nem o tempo lá ia, só o desprezo

Fiquei com tanta pena
Daquele pedaço de asfalto sozinho
Sem escutar nenhuma conversa
Quem dera um verso em desafino
Ou um jogo se bola, um encontro de amigos
Ou um beijo noturno, escondido do mundo
Nem início de surto, nem passarinho
Nem pra lá se vão os cachorros sem lar
E antes de alguma coisa falar, ninguém vi
Lá tem nada, nada, nada
Fiquei com tanta pena

sexta-feira, 29 de abril de 2011


O  TÁLAMO

O tálamo é sagrado
e nele não se esparramam
outras costas, não roçam outros pés
e nem puxam lençóis outras mãos trêmulas.
Há de se manter sempre o mesmo odor,
que exalam das mesmas fontes.
É necessário para a paz no tálamo
a regularidade de sujeira,
manchas laváveis e surdas,
febre e atletismo.
É recomendável que a madeira estale
como a lenha em dia de cozido na roça.
Estar-se-á  por esta razão eximido
de qualquer crime ambiental.
Deixe a madeira cantar aguda e desafinada.
Mas não é este pedaço um território de ninguém.
Não é zona de conflito.
É país democrático e sem preconceitos.
Área de proteção sentimental.
Outros leitos talvez sejam adequados
Para  ringues de vale-tudo 
e outros experimentos diversos
mas o tálamo não.
Nele o limite é para dois
numa matemática perfeita e química idem.
E se o dois for de duas metades,
és um tálamo abençoado
e filial do paraíso.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

O BICHO

O progresso avançou como um bicho.
E deitou sobre nós com dentes à mostra,
em suas pontas vem a derradeira morte.
Nós retrocedemos rumo ao capricho
e ainda feridos, ferimos a quem se gosta
Obstinados que estamos em jazer à própria sorte

O progresso avançou como um capricho
E deitou sobre nós como a quem se gosta
Em sua mais lasciva ilusão de sorte
Nós retrocedemos feito rústico bicho
Que ainda ferido, põe os dentes à mostra
Obstinados que estamos no encontro com a morte.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

FIO  DO  DESPREZO

Ela desembainhou seu afiado desprezo
a atirou no meu peito, sem cerimônia, sem pestanejar,
sem olhar, sem ao menos olhar

Sem movimento nenhum, sem fazer alarde,
assim já ficou tarde logo às nove da manhã. Ela me doeu,
sem olhar, sem ao menos olhar

E matou a pretensão que havia, que era tudo que cabia
no meu peito são. Sem abrir a boca disse; Não!
Sem olhar, sem ao menos olhar

Ela me assassinou no Parque da Cidade,
e toda grade que viu não enxergou quão grave era a minha desilusão,
que ela me deu sem esticar a mão, e nem ao menos olhar.